quarta-feira, 18 de junho de 2008

CONSTRUIR, HABITAR, PENSAR(Seminário / Noturno)

CONSTRUIR, HABITAR, PENSAR

M. Heidegger

Este ensaio de Heidegger é bipartido, concentrado em duas questões fundantes: “O que é o habitar?” e “Em que medida pertence ao habitar um construir?”. Entretanto não se trata de maneiras de se organizar um local, tão pouco de prescrições sobre como deve se construir algo. A investigação presente no texto busca a essência do construir, aquilo que ele é.

I

Como se dá a relação entre o habitar e o construir, este é o primeiro ponto do texto. Em primeira medida parece haver uma relação de meios e fins entre as duas idéias: todo construir teria como meta um habitar. Entretanto, quando se relacionam as essências esta relação meio-fim não se dá adequadamente.”O acesso à essência de uma coisa nos advém da linguagem” e é pela linguagem que Heidegger afirma que o construir já é em si mesmo um habitar – a palavra do antigo alemão para dizer construir, “baun”, significa habitar. Ainda o verbo bauen, construir, é a mesma palavra alemã “bin”, “ser”. Logo há no alemão correspondência: quando diz “eu sou”, “tu és”, diz também “eu habito”, “tu habitas”. A palavra alemã bauen (construir) diz que o homem é à medida que habita. Porém, bauen significa ao mesmo tempo “proteger, cultivar”, ou seja, trata-se de um construir que não é só produzir, mas também cultivar, cuidar do crescimento que se dá por si só.

Dessa forma construímos – ou seja, edificamos e cultivamos – “à medida que habitamos, à medida que somos como aqueles que habitam”. Mas o que é o habitar, qual sua essência? Mais uma vez é à linguagem que se vai a busca da essência, e do gótico tira a lição de o traço fundamental do habitar é o ‘resguardo’, é ser e estar apaziguado, permanecer em paz. A essência do habitar, o resguardo, é o permitir devolver algo ao abrigo de sua própria essência. Então entendemos o que eu quer dizer Heidegger quando diz, no começo do texto, que o caminhoneiro habita na estrada, ou o engenheiro na fabrica, bem como podem faze-lo em suas moradias, pois ali estão construindo a eles mesmos, se cultivando entre os mortais, sobre a terra.

Os homens mortais, esses que habitam, estão “sobre a terra”, “sob o céu”, e “permanecem diante dos deuses”. Esses quatro pertencem um ao outro numa unidade originária. Cada um deles remete aos outros três, ainda sim, ao falarmos de um não alcançamos a simplicidade dos quatro reunidos. E habitando os mortais são na quadratura, ou seja, habitam na medida em que resguardam a quadratura, permitem que ela seja apaziguada em sua essência. Dessa forma, o próprio habitar tem no resguardo quatro faces.

Porém não basta salvar a terra, acolher o céu, aguardar pelos deuses e conduzir os mortais para que habite plenamente. Habitar é se resguardar junto às coisas, pois esse demorar-se junto às coisas é justamente a simplicidade da quadratura. As coisas no entanto só abrigam a quadratura quando são resguardadas, ou seja, quando o homem cultiva aquelas que crescem por si e edificam as que não o fazem. “Habitar é construir desde que se preserve nas coisas a quadratura”.

II

“Em que medida construir pertence ao habitar?” é a questão que direciona a segunda parte do ensaio, e a partir de sua resposta é que se esclarece o que é o construir pensado a partir da essência do habitar. Para tanto Heidegger pensa o lugar, o espaço e a relação entre este e os homens.

Continuamos pensando sempre em relação à quadratura. A ponte, que é de onde parte o autor, reúne integrando a quadratura – a terra, o céu, os deuses e os mortais – e como reunião ela é uma coisa. Coisa é uma reunião integradora. A ponte, que é coisa, e que tem suas características próprias cria estância e circunstância para a quadratura. Lugares, por sua vez, são essas coisas que propiciam estância e circunstância à quadratura. Os lugares criam e organizam espaços, e os espaços são limites onde as coisas dão início a suas essências. Os espaços, então, recebem sua própria essência dos lugares, das coisas.

Estão se estão relacionados essencialmente, e ainda sim são diversos, surge a pergunta: “Como o lugar se relaciona como espaço?”. Os espaços contém e são organizados pelos lugares; compreende os “spatium” (espaço entre coisa e entre coisas e homens) e as “extensio” (extensão de algo). Além disso é diferente “do” espaço, que é a abstração máxima, representada pela métrica. Dessa diferença é que se torna claro o fato de que a essência do espaço não é fundamentada pelos números das medidas que estão sempre presentes quando falamos nele. Os espaços como os entendemos aqui, e com os quais nos relacionamos diariamente são arrumados pelos lugares e tem sua essência fundamentada nas coisas que chamamos de coisas construídas.

Qual é então a relação entre o homem e o espaço? Para responder a essa pergunta recorremos a uma passagem esclarecedora do texto: “O espaço, porém, não é algo que se opõe ao homem(...)Ao se dizer ‘um homem’ e ao se pensar nessa palavra aquele que é no modo humano, ou seja, que habita, já se pensa imediatamente no nome ‘homem’ a demora, na quadratura, junto às coisas”. O homem se relaciona com o espaço demorando-se junto às coisas, estando numa estância e circunstância dada pelas coisas/lugares.

“Somente em sendo capaz de habitar é que podemos construir”. Com essa idéia é que se relacionam de forma final espaço, lugar e homem, pois só se pensa o homem habitando, numa estância e circunstância, e o habitar só se dá junto do construir, seja ele como cultivar ou edificar. O homem só é articulando espaços, pois está na quadratura e junto às coisas. O habitar que é o ser/estar do homem recebe sua essência do construir e do pensar.

2 comentários:

Mauro César disse...

Pessoal,
arquivos PDF do Seminário-síntese sobre Heidegger, contendo "A Questão da Técnica" e o "Construir, Habitar, Pensar".

http://docs.google.com/fileview?id=F.5c91f636-e54b-446b-9a20-701050fadb8a&hl=en

http://docs.google.com/fileview?id=F.22876c36-a06c-4ca0-ada4-d98352cdcaef&hl=en

Mauro César

Anônimo disse...

MUITO BOM! Me ajudou bastante, obrigada!